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COLUNAS

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Acabo de visitar o Museu de Arte Contemporânea de Serralves, na cidade do Porto. A transdisciplinaridade sem duvida é a tônica da atual programação do museu que vai até janeiro de 2019, obrigando-nos a repensar os processos de ocupação, utilização e construção dos lugares institucionais. Além de expor os mais recentes Jeff Koons em ampla individual, uma grande exposição com peças monumentais de Anish Kappor espalha-se pelo Parque Serralves e pode-se ver uma intimista mostra de projetos de suas maquetes - a maioria ainda inéditas. No entanto, uma exposição me chamou especialmente a atenção: Zero de Conduite.

O título é baseado em filme francês de Jean Vigo de 1933. Com o nome português Zero em Comportamento a mostra passeia pela coleção Serralves refletindo sobre as atitudes que poderiam ser reprimidas num museu por conter gestos de irreverência, ligações com universos marginais, desobediência ou desrespeito às regras do bom comportamento. Temas intratáveis, imagens desagradáveis , objetos ingovernáveis, desde o furto como apropriação até a mais radical rejeição ao que se pode chamar de arte convencional. Um vídeo de Mario Garcia Torres reflete bem a intenção da mostra em romper com as rígidas regras de comportamento e a tirania purista de alguns museus e instituições. Um grupo de jovens é filmado correndo pelos espaços expositivos do Museu Nacional de Arte de Madri passando batido por Picassos, Caravaggios e Tápies. Numa diversidade de suportes a mostra ultrapassa todos os limites do bom gosto, do bom comportamento e do bem feito num ataque as figuras de autoridade que marcaram a arte dos anos 60, numa reivindicação ao amadorismo e ao antivirtuosismo. Entre os poucos brasileiros na mostra, está o nosso Artur Barrio. Imperdível para quem estiver em Portugal ou por aqui pretende estar até janeiro.


LIVRARIA LELLO DE EÇA A HUGO MAE

De arquitetura neogótica, não é apenas por ser uma das livrarias mais famosas e bonitas do mundo, nem por ter servido de inspiração para J K Rowling, antiga moradora do Porto, escrever a saga Harry Porter que a Livraria Lello merece uma visita. Suas paredes e estantes dizem o que “só os que leem ou escrevem sabem ouvir”. A fila na porta assusta um pouco, mas se formos bons observadores podemos nos distrair com a bela fachada deste verdadeiro templo das letras e em poucos minutos estaremos dentro da livraria. Verdadeira alma da livraria durante 52 anos, Domingos Lima como todo bom livreiro conhecia de memória o extenso catalogo da casa que hoje abriga dos mais antigos Eça de Queiroz ao contemporâneo Walter Hugo Maria Mae. Destaque para a atual exposição de gravuras de Joan Miró ilustrando poemas de Pablo Neruda, André Benoit e João Cabral de Mello Neto. Raro encantamento.

Vilmar Madruga 6 min · 


DE AMIZADES, POESIA E CACHORRINHOS COM SOTAQUE


Fazer amizades quando estamos fora de nosso país é por sí só algo interessantíssimo. Agora, imagina vc estar numa cidade e fazer amizade com um cara que trabalha com turismo da maneira menos convencional possível, isto é, te mostra lugares que ele mesmo como morador gosta de frequentar. Foi assim que o meu mais novo amigo Paulo Oliveira me apresentou aos cachorrinhos da batalha. Explico. Há na cidade do Porto, a Cervejaria Gazela, dessas portinhas por onde o turista passa batido mas, um lugar onde come-se um cachorro quente do melhor: uma versão com sotaque português do americano hot dog em pão crocante, levemente apimentado e servido como tira gosto para acompanhar o fino (nosso chopinho).Trata-se da Cervejaria Gazela, próxima à Praça da Batalha. O dono te cumprimenta mas (felizmente) não senta-se com vc no apertado balcão. Imperdível. De quebra, conheci a Casa Bô, um lugar em que toda quarta feira, os poetas e artistas locais se encontram para dizer poesias, tomar um vinho e ouvir canções.

Convidado a dizer poemas tive o privilégio de falar o português Pedro Homem e os brasileiros Fernanda Morse eMarcelo Reis de Mello.


FADO VADIO


A fachada de cores fortes é simples e há roupas penduradas nas janelas. Lá dentro, um cenário de Almodóvar: paredes carmins e mesas postas com tiragostos sob toalhas coloridas. Neste ambiente da Alfama em Lisboa acontece o Fado Vadio. Nada a ver com o sofrido fado portugues. O fado vadio nasceu como uma especie de repente entre açougueiros, lavadeiras e gente do povo que iniciavam verdadeiros desafios com suas vozes e composições. Ao contrario do fado tradicional o vadio como o nome bem diz vagueia pelas tabernas portuguesas com grupos de quatro a cinco músicos que se revezam em nostalgica cantoria. Um dos mais concorridos é o da Tasca Bela na Alfama.

Tem se que reservar com antecedencia p se fazer os pedidos antes de apagarem se as luzes e começar o fado. É proibido fotografar. Toda quarta a partir das 20:30h. Um belo programa p quem estiver na terrinha.


O QUE NOS UNE, O QUE NOS DIVIDE



O fotógrafo sul africano Pieter Hugo foi criado na África do Sul no periodo pós colonial. Testemunha do apartheid, sua fotografia capta vestígios visiveis e invisiveis do fosso entre o idealizado e o real. Seus personagens vivem sob a sombra da repressão cultural e do dominio politico. Sem tetos, domadores de hienas, crianças africanas, transexuais e pais de família são tratados com a mesma reverência por suas lentes. São 15 séries fotográficas reunidas na mostra Entre a Espada e a Palavra que vai até o dia 7 de outubro no Museu Coleção Berardo em Lisboa.


Por Vilmar Madruga.

  • 14 de out. de 2018
  • 6 min de leitura


Primeiro foi o Museu do Louvre. Tantas vezes na cidade e não tinha animo para visita-lo. Não só pelo tamanho das filas (a única que enfrento com disposição é a da Pastelaria Belém, em Lisboa, por óbvios motivos) mas - pelo que, de antemão, sabia que lá iria encontrar. Há três anos tomei coragem e fui. Mais para vencer um preconceito do que por curiosidade.


Agora foi a vez da Torre Eiffel. Sempre tive vergonha de dizer que achava feia uma construção que se tornou o símbolo de Paris. Até ver que não estava só: o poeta Paul Valery traçava mapas com trajetos onde saísse de casa sem ver o monumento (tarefa quase impossível),horrendo em sua concepção. Pois desta vez, Paris amanheceu nublada e o turista acha que nuvem é sinal de chuva, portanto - pasmem, ao chegar lá, haviam apenas quatro pessoas na fila. Soube que depois que o sol abriu o tempo de espera passou para 2:30hs. Paris vista do alto e ainda mais linda. Não houve arrependimentos. E mais uma vez fui agraciado por outra fase eliminatória de todo e qualquer preconceito. O que para um senhor sexagenário cai muito bem. Mas, por hoje chega! Partindo para ver Gordon Matha Clark no Jeu de Pomme. Rs


LIBERTÉ, FRATERNITÉ, DÉSOLÉE


Quando me perguntam como na canção de Caetano: Onde está você agora? E respondo: Paris. O comentário é invariavelmente o mesmo: tá chic,, hein? Será? Algumas civilizações carregam esta aura de excelência e elegância, o que faz com que simples mortais colonizados como eu, experimentemos certa inadequação a determinados padrões sociais que vão além do oceano que nos separa. É inegável e inestimável a herança francesa como patrimônio cultural da humanidade. Mas, não houve até hoje revolução que resolvesse o problema da desigualdade social no país. Em Paris acordo cedo e durmo tarde. Ando pelos metros que cruzam a cidade. A mesma cidade partida que meu amigo Zuenir Ventura, denunciou no Brasil. Uma massa pobre e sonolenta que cruza a cidade para limpar casas que nunca poderão ter. Na volta, o mesmo desodorante vencido dos trens da Central do Brasil. Moleques ocidentais loiros dentro de confortáveis bermudas tomam sorvetes nas tuk tuks em volta do Champs Elysees observados por crianças de famílias refugiadas que suam em suas pesadas vestes ou dormem em velhos colchões debaixo das marquises da Christian Dior. O fosso social do mundo não acabou. E não há fragrância que mascare isso.


ARTISTAS FORA DA CASINHA


Quando a cidade é tão bela quanto Amsterdam alguns torcem o pescoço para não ver destoantes cenários industriais ou portuários não tão charmosos. Pois foi para um velho estaleiro no norte da cidade, o NDSM, que alguns artistas, designers, arquitetos e estilistas se voltaram. 

Como acontece na fabrica Bhering no Rio e na Lx Factory em Lisboa a tendência de dar uma ocupaçao digna a antigas fábricas, silos e estaleiros só faz crescer no mundo todo. Atravessei o canal para o lado norte da cidade hoje (há uma barca gratuita saindo de 20 em 20 minutos) para conhecer o local, em cuja entrada o brasileiro Kobra pintou um imenso painel com o retrato da ilustre menina judia Anne Frankie. A maioria dos ateliês não está aberto ao publico nesta época. Aguardam o portas abertas para 13 de outubro.

Mas, dá pra ver alguns trabalhos na coletiva que está rolando agora e dar uma passada no simpático Café Noordelicht, espaço cultural com shows e cardápios ecléticos da cozinha vegana a grelhados cujos preços cabem no bolso. Com direito à bela vista para os canais.


INSULINDE


Chovia quando cheguei em Amsterdam. Deu preguiça de sair. Precisava de uma bebida quente antes de me entregar ao sono. Em frente ao hotel havia o Café Insulinde. Luz acolhedora, juke box tocando de Amy a Michael Jackson e Janny atendendo um único cliente, um jovem sexagenário como eu, rabo de cavalo, boca do Mick Jaegger vermelha botando a língua pra fora no botton sobre a jaqueta de couro. Não havia dúvida: estava no Oost como os holandeses chamam o lado este da cidade.

Não precisa dizer que Paul Knaven, Janny e eu ficamos amigos. Pudera. Somos sempre e apenas nós, todo o final do dia batendo ponto no Insulinde.Janny, claro, porque trabalha lá e tem como tarefa nos expulsar na hora de fechar, rigorosamente a 1 hora, ainda que sentada à mesa conosco e parecendo se divertir com minhas estórias contadas num inglês cheio de gaps. Há um clube de sinuca rolando às quintas. Nada q atrapalhe nosso sossego. Falamos de arte, clima, imigraçoes, origem da cidade. Coisa de viajantes solitários...


SALZBURG


Há séculos que não sei o que é dormir ouvindo cascos de cavalos puxando charretes e acordar com sinos de igreja contando as horas. Tem sido assim em Salzburg, aqui na Áustria. Cedo andei pela floresta próxima a Fortaleza de Hohensalzburg. O morador Mozart não era o único a consumir grandes quantidades de velas para compor a noite. Era comum o incêndio de casas. Uma das funções das torres de Hohensalzburg era avisar aos bombeiros sobre os focos de fogo que se avistava na aldeia. 

É época do festival de óperas e concertos ao ar livre. Assisti, numa iluminada Praça da Catedral hoje a noite, a ópera Pique Dame, de Tschaikowsky, com a primorosa tradução da Marieta, uma amiga austríaca, casada com meu querido Adriano De Souza Ribeiro que me recebeu ontem ostentando, além do enorme carinho, uma inconfundível camisa do flamengo neste clima medieval. Depois de tantos hotéis, aeroportos, estações e faz-desfaz de malas, a benção da pausa.Da volta ao idioma pátrio. Da mesa em família. Crianças. Do partir do pão e do repartir estórias. Deus é bom em tempo integral. Misturo minha vida com a desses amigos. Até o próximo destino.


DOMINGO É DIA 


de banho social democrata nas águas do Lago Wallersee, o maior do norte de

Salzburg.Uma área de lazer popular para banhos, pescadores credenciados, barcos à vela, windsurf, enfim, esportes aquáticos que não dependam de motores nem poluam a pródiga natureza do lugar. Depois de um belo almoço de domingo partimos hoje para um banho em família. A água é surpreendemente agradável. Diferente do inverno (foto)

quando a área congela tornando possível a patinação no gelo. Como ainda é verão, depois do mergulho tiramos um bom cochilo na grama.


SALZBURG, TURISMO, CADEADOS E PRÍNCIPES

Não sei se acontece com vc. Sempre q volto de viagem me perguntam sobre algo em determinada cidade: Vc foi lá? Se vc não tiver ido vai ouvir: Ah, então vc não foi! Pois, há muito que desisti de conhecer tudo que um lugar oferece como se nunca mais fosse voltar ali. E pra comprovar que estou certo sempre acabo voltando. O problema é q troco qualquer desses passeios imperdíveis por um bom papo com alguém da cidade, algumas horas de leitura ou até por um cochilo na grama de um parque. Em alguns países europeus ainda podemos fazer isto e acordar com a carteira e o celular no bolso. Passo boa parte do tempo, no entanto, dentro de museus. Salzburg não tem um museu de arte

contemporânea (!!!) mas, em algumas de suas galerias pode-se ver Picasso, Calder, Arnulf Rainer, entre outros. Todos à venda. Mudando de assunto: Numa dessas andanças passei por uma das pontes dos cadeados sobre o Almkanal em Salzburg. Os de Paris foram retirados quando se tornaram um amor de peso: 45 toneladas. Em Salzburg, dizem, são retirados de tempos em tempos, o que torna as tais juras de amor não tão eternas por aqui. Para não dizer que estou sendo um turista mal comportado visitei antes de lá cochilar, o florido Jardim e o Palácio Mirabell, construído pelo príncipe-arcebispo Wolf Dietrich para sua bela amante Salome Alt, que acabou lhe enchendo o palácio com quinze filhos. O jardim conserva o desenho barroco original e é impecavelmente conservado com

arranjos de doer o olho de tão bonitos. O salão de baile do príncipe é considerado hoje o mais romântico cenário para casamentos. Fofo, né?


MOBRALSBURG

As placas de identificação de lojas, restaurantes, pousadas e bares da Getrei Degasse, rua em q nasceu Mozart em Salzburg têm uma curiosidade. Todas trazem uma imagem ligada ao seu negócio. Uma bota anuncia uma sapataria; uma chave, uma hospedaria, ramos de trigo uma cervejaria. O costume surgiu devido ao analfabetismo de antigamente e a representação do objeto dispensava a leitura. Na placa do Mc Donalds... a letra M


SEM TÍTULO



Acordo em Zurique com o dia se espreguiçando em ruídos de grilos e trilhos de trem. O amigo que me hospeda é colecionador de arte e vou ao banheiro cuidando para não tropeçar em objetos, pequenas instalações, quadros no chão. Não há na casa um centimetro ocioso. Como todo colecionador meu amigo Blank sabe que a melhor maneira de conservar uma obra de arte não é guardando-a mas mantendo-a exposta. Assim durmo com picassos, mirós, boteros e heitor dos prazeres. Punky, sua mulher, descobriu uma trilha na floresta e vamos explorá-la daqui a pouco, depois do café da manhã. Só então vou me misturar à cidade. Provavelmente me enfiarei em algum museu. 


Em tempo:



O brasileiro Ernesto Neto acabou de desmontar a maior instalação de arte que a Estação Central de Zurique já recebeu: A GaiaMother Tree. Durante a exposição o artista reuniu líderes de comunidades indigenas do mundo todo para falar de sustentabilidade e resistência. Perdi essa.


Por Vilmar Madruga.

  • 15 de ago. de 2018
  • 2 min de leitura

Orgulho1


“Orgulho” é uma produção franco belga do diretor e também ator Yvan Attal (“Minha mulher é uma atriz”, de 2001 e “Viveram felizes para sempre”, de 2004) que estreiou no Festival Varilux de Cinema Francês 2018 e talvez seja um dos melhores filmes atualmente em cartaz e que vi nos últimos tempos. Primeiro porque trata de um tema atual, real e sério, pois aborda o preconceito e o racismo francês em relação a pessoas de origem muçulmana, aos negros e de uma forma mais ampla aos imigrantes em geral, mas apesar de se passar na França, poderia ser em qualquer outro país da Europa e vai muito além de qualquer fronteira. O próprio diretor é um cidadão franco israelense que nasceu em Israel, mas cresceu nos subúrbios de Paris, então certamente viveu na pele ou presenciou essa forte intolerância racial.



Orgulho2


O filme conta o embate de Pierre Mazard um professor arrogante e preconceituoso interpretado pelo ator Daniel Auteil que implica com uma aluna do Curso de Direito que chega atrasada em seu primeiro dia de aula. Neila Salah, vivido por Camélia Jordana, é uma francesa de origem Argelina, que vive no subúrbio de Creteil e é abertamente discriminada pelo mestre na frente de toda a classe por questões de raça, aparência, roupas e linguajar.


A agressão verbal acaba sendo filmada por outros alunos e o caso vai parar nas mãos do reitor da Universidade que exige que o

professor tente limpar sua imagem para não ser expulso, em troca ele daria um treinamento especial à aluna para que ela representasse a Instituição num concurso de retóricas.


De início a relação de ambos é visivelmente conturbada e provocativa, mas aos poucos o professor instiga a aluna a prosseguir nos estudos e a faz navegar e aprofundar-se pelos 38 estrategemas de Schopenhauer, do livro “A arte de ter razão”. Assim, Neila acaba por dominar a técnica da persuação e é eleita para representar a Universidade, mas ao descobrir que estava sendo manipulada e usada como uma forma de retratação, quase desiste de tudo. Magoada com o professor fica dividida e terá que decidir se irá acusá-lo ou absolvê-lo das ofensas iniciais pela qual passou, na junta que irá julgar a conduta do mestre.



Orgulho3


Camélia Jordana obteve o César 2018 de Melhor Atriz Revelação, o oscar do cinema francês. O veterano Daniel Auteil também está muito bem no papel do polêmico professor e integram ainda o elenco Yasin Houicha, Nozha Khouadra, Nicolas Vaude e Jean-Baptiste Lafarge.


O próprio diretor Yvan Attal refere-se a seu filme como uma dramédia, uma comédia dramática que consegue arrancar algumas risadas, e ao mesmo tempo aborda questões político sociais importantes, mas tudo isso de uma forma bem leve, movimentada e positiva, que prende a atenção com frases filosóficas e que faz do longa diversão garantida pra todos os públicos.


Por Ula Pancetti.


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