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As "Formas Sintéticas" de Daniel Feingold chegam a Ipanema

  • Foto do escritor: andréia gomes durão
    andréia gomes durão
  • 17 de jun. de 2019
  • 4 min de leitura

O artista plástico Daniel Feingold abre a exposição "Formas Sintéticas" nesta terça-feira, dia 18, na Cassia Bomeny Galeria, em Ipanema. A mostra poderá ser visitada até 30 de julho. O texto crítico é de Felipe Scovino.

"O que me chama a atenção nos últimos trabalhos realizados por Daniel Feingold e agora apresentados na Cassia Bomeny Galeria é o fator de encadeamento entre eles. Nesse corpo de obras, identifico três grupos de trabalhos que analisarei em seguida. Contudo, antes disso, percebam não só a autonomia que cada obra de arte possui, mas como esses grupos criam relações estruturais e formais sem qualquer estabelecimento de ordem e valor. Essas obras parecem sempre saltar a um novo desafio ou suporte. É interessante perceber nessa exposição como o artista lida, pensa e estuda o plano; e, como fundamentalmente constrói seus campos de cor e espaços de organização.


Um primeiro conjunto de obras obedece a um certo ritmo organizado e construtivo. Uma mesma forma se repete – tendo o molde do bastão de óleo como modelo – criando composições seriadas, algumas monocromáticas, outras variando em conjuntos multicoloridos compostos por tonalidades em azul, preto, chumbo e vermelho.


Sem dúvida, há uma sobriedade nessas pinturas em papel. Prefiro nomeá-las dessa forma a desenhos. Gosto de pensar que o trabalho de Feingold pensa a si próprio como algo insatisfeito com a sua própria condição. Nesse sentido, é duplamente transitório e ágil: primeiro, pela sua condição ou desejo de saltar do plano, e segundo pela forma como a cor se apresenta. Possui traços ritmados e inquietos, ao mesmo tempo em que obedece a um "esquema programático".


Afirmo dessa forma porque parecem simplesmente feitos ao acaso, porém são gestos deliberados sobre o papel ou a tela, pois querem constituir um espaço. Esse conjunto de obras tem algo em especial que invariavelmente é trazido, que é a falta. Em duas obras, o papel é completado por formas semelhantes a um bastão preto preenchido de óleo dispostas horizontalmente. Em determinado momento abre-se uma espécie de clarão sob esse véu negro e o que adentra é a luz: uma, em forma de óleo sobre bastão rosa, e outro, em azul. Esse sentimento de complementariedade entre as formas e a constituição de campos de cor que criam um balanço preciso e harmônico é algo, aliás, presente em toda a sua obra.


Já um segundo grupo de obras, também tendo a forma em bastão como figura central e mobilizadora de uma dinâmica, escoa suas formas pelo espaço do papel, tendo a dimensão desse suporte como limite. Paradoxalmente, as figuras parecem estar comprimidas e simultaneamente constituem uma força de fora para dentro, almejando "quebrar a moldura".


Há um encaixe perfeito entre as formas elaboradas por Feingold. Entre elas não há conflito. Ademais, acentuo a perspectiva, já colocada por outros críticos sobre o trabalho desse artista, de uma composição geométrica que se aproxima indefinidamente do campo da arquitetura. Nesse conjunto, em especial, existe a proximidade com uma planta baixa. Essa oscilação entre o que é pintura e o que é arquitetura, o que é real e o que pode vir a ser, entre o que é próximo e o que é imaginário, entre o que é possível ou planejado e o que é especulação e utopia é uma das forças de seu trabalho.


Ainda sobre esse conjunto é interessante perceber como Daniel projeta por meio de finos traços uma projeção de formas e, por conseguinte, territórios. São como membranas, suaves e delicadas, que pouco a pouco elaboram uma nova camada sobre aquela já constituída. Há algo de 'projetual' e inacabado sobrevoando essas estruturas e, sem dúvida, a evidência de uma aspiração ao espaço. Pouco a pouco as formas se 'estufam' e anseiam se desprender do plano. A ideia de inacabado acentua a atmosfera de que a obra está em constante realização.


As Pinturinhas – série realizada com bastão óleo sobre tela – congregam as questões formais e conceituais das outras duas séries. Há um senso de organização da forma e da cor nesse suposto emaranhado de figuras aleatórias dispostas sobre o plano. Uma coisa importante a se dizer sobre o seu trabalho é que Daniel não desperdiça nada: não há um traço em vão, uma linha que escape ou um campo de cor que tenha sido adicionado sem razão, pois mesmo numa composição que parece estar inchada e caótica, pouco a pouco se observa uma razão harmônica para aquela constituição de formas e cores.


Uma frequência pouco oscilante atravessa a obra e evidencia o caráter de equilíbrio da composição escolhida por ele. Nas Pinturinhas, os bastões parecem pousar sobre o papel mas com o propósito de construírem camadas que se sobrepõem a todo momento. A linha sinuosa, fraturada e envolvente torna transparentes as estruturas transitivas, próprias dessas obras. Não são pinturas que elaboram volumetria ou densidade, apesar de serem feitas a óleo, mas efetivam esse real e sincero interesse de Feingold em alcançar o espaço.


Esse foi um desejo moderno da pintura que hoje, claramente, possui outra configuração. Como, por exemplo, a pintura se aproximando da vida e, em particular, da urbes. Decerto, sua obra tem uma proximidade, como já apontado no texto, com a arquitetura, e esse fato ganha mais intensidade quando percebemos a presença do grid, uma herança modernista presente de forma contundente tanto em Mondrian quanto em Agnes Martin ou Frank Stella.


Entre sua composição de malhas ortogonais estão representadas metaforicamente imagens de fachadas de prédios, ruas, vielas e outros elementos da cidade. Pelo fato de nos oferecer uma urbe recortada, que não se revela por completo, nunca temos a percepção de um todo, e sim de uma perspectiva oblíqua. Eis outra força de seu trabalho: a capacidade de nos levar alhures."


Felipe Scovino, crítico e curador


A Cassia Bomeny Galeria fica na Rua Garcia D'ávila 196.


Foto: divulgação

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