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O trepidante confinamento em Paris da blogueira Ana Paula Cardoso

  • Foto do escritor: andréia gomes durão
    andréia gomes durão
  • 31 de mar. de 2020
  • 3 min de leitura

A jornalista Ana Paula Cardoso, blogueira que assina o Crônicas de Paris, parece estar longe de precisar de sugestões de entretenimento para sua quarentena. Confinada em seu apartamento no 15º arrondissement da capital francesa, ela aproveita o sol da Primavera recém-chegada na mesma varanda de onde mantém o mundo atualizado sobre a pandemia do novo coronavírus na França.


Para isso, além das lives diárias em seu perfil no Instagram (@cronicasdeparis), Ana Paula é a correspondente em Paris do Click Tube News (plataforma em que também mantém seu canal Cine Viagem), contribui com depoimentos para a Veja Rio, para a Super Rádio Tupi, entre outros. Responsável pela comunicação do núcleo parisiense do Mulheres do Brasil, a jornalista também se engaja nas ações do grupo para este período de luta contra o Covid-19. E por aí vai...


Como se a agenda não estivesse suficientemente trepidante, Ana Paula decidiu que faria das leituras obrigatórias do tempo da faculdade de Filosia na Sorbonne leituras recreativas durante o confinamento. O resultado? A blogueira ainda encontrou um tempinho para escrever para esta coluna e nos contar:

"Me julguem. Como toda intelectual, que eu supunha ser, entrei na quarentena focada em fazer coisas úteis e engrandecedoras ao espírito. Eram duas as missões mais preeminentes: arrumar a papelada acumulada em 6 anos de burocracia francesa e ler os clássicos de filosofia de uma forma descompromissada.


Explico: não tendo mais o que fazer além de me adaptar a uma nova cultura, aprender um novo idioma, trabalhar em três línguas diferentes e ficar ansiosa por não dar conta de aproveitar Paris, resolvi voltar a estudar. Não, senhores. Não fui fazer um mestrado em Comunicação, profissão que exerço há mais de 30 anos. Fui fazer uma graduação. Em Filosofia.


A pobre iludida aqui acreditava ser a chance de realizar um sonho e poder desenvolver, junto com os colegas e professores, a arte da reflexão fundamentada por teorias clássicas, modernas e contemporânea. Qual não foi minha surpresa...(adoro essa expressão, preâmbulo oportuno para iniciar a narrativa de uma situação decepcionante). Pois bem, qual não foi minha surpresa ao me deparar com uma molecada de 20 anos, esnobe e competitiva, e professores exigentes em grau 5 de velocidade créu.


Mas e o René que eu tanto amava? Formei-me na faculdade descartando Descartes e me apaixonando por Damásio, que tão bem desvendou o erro do francês. Aristotelismo e platonismo são amigos de costas um para o outro. E Santo Agostinho, que eu até então julgava um traidor de sua amada, me seduziu com sua arte de fundamentação sobe o amor.


Mas no meio do caminho ainda houve a filosofia de gênero, pela qual relanço o encontro marcado com Simone. Ler "O Segundo Sexo" pensando na prova não foi prazeroso e eu determinei que, tão logo colocasse as mãos no diploma, La Beauvoir estaria de novo comigo. Já sem obrigação de notas, estaria eu só na leveza de compreender como a gente se torna mulher.


Posterguei, posterguei, até o dia do confinamento. Arrumei alguns papéis. Peguei o livro da maior filósofa do feminismo de todos os tempos. Primeira página. Segunda página. Terceira página. Pera aí, vou voltar um parágrafo. Deixo o livro de lado. Volto dois dias depois e vou lendo direto até a página 11. Levei algumas horas. Relia frases tentando entender se eu estava emperrando por conta do idioma (afinal, o francês não é minha língua materna). Pego o dicionário e constato que o buraco estava mais para a teoria complexa que para os significantes e significados.

Largo o livro, vou para as redes sociais. Encontro uma página de séries e desenhos antigos. Passo 25 minutos assistindo a um episódio de "Jeannie é um gênio", em que ela apronta porque quer casar com o "amo", Major Nelson. Gargalho em vários momentos.


Confisquem meu diploma da Sorbonne. Chamem-me de recatada e do lar. Sou uma feminista de araque e uma intelectual de fachada. Agora, no confinamento, vou botar em dia são os episódios de "A Feiticeira", "Agente 86" e "Mary Tayler Moore". Aquele abraço de longe."


Não satisfeita, essa "carioca de Paris" e a Torre Eiffel não são apenas vizinhas, mas também celebram aniversário juntas neste 31 de março. Felicidades para elas!

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