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COLUNAS

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  • 8 de ago. de 2018
  • 4 min de leitura

Atualizado: 12 de out. de 2018


Egon Schiele – Morte e Donzela ,do diretor Dieter Berner é o próximo lançamento da Cineart Filmes que estréia agora dia 19 de Julho e conta a vida deste pintor, contemporâneo de Klimt, e um dos grandes nomes do movimento expressionista austríaco. Aborda sua vida errante, a influência de suas inúmeras modelos e musas em sua obra, até a sua prematura e trágica morte em 1918, causada pela epidemia da gripe espanhola na Primeira Guerra Mundial que infelizmente não o permitiu vivenciar toda a glória e o esplendor de sua arte.


Ainda jovem, perde o pai que morre de sífilis e desde então passa a ter uma vida itinerante, ora em Viena, ora em pequenas cidades do interior, onde passa a morar sozinho com sua irmã mais nova Gerti, uma de suas primeiras musas. Vivem tanto da venda de seus desenhos, como das parcas economias que seu tutor o enviava.


Logo no início o filme talvez querendo mostrar o lado provocativo e controverso deste grande artista nos choca por fazer uma insinuação de uma relação quase incestuosa com sua irmã ou pelo menos algo que poderíamos dizer que seria muito fora dos padrões convencionais do amor e intimidade entre irmãos. Coisas que compreendiam desde um ciúmes doentio entre ambos até o estranho hábito de usá-la como modelo e pintá-la nua.


Sua vida libertina o faz se envolver com uma atriz negra de um prostíbulo, Moa Mandu e que por tempos passa a ser a musa da vez, o que provoca inúmeras brigas com sua irmã. Juntamente com elas e outros dois amigos artistas, passam a viver todos juntos e escandalizam a pacata cidade de Krumau. Nessa época surge o Neukunstgruppe “Grupo nova arte”, que rompia com o lado conservador da Academia de Viena.


Mais tarde essa tendência de chocar e contrariar a sociedade local e a mania de usar modelos menores de idade , o leva à prisão, acusado de ter sequestrado uma jovem de 14 anos, Tatjana von Mossig. Mesmo tendo sido inocentado , fica por um tempo detido, pois sua obra era considerada por demais erótica e pornográfica. Inclusive teve um de seus desenhos queimados pelo juiz em plena corte e centenas de obras apreendidas no período.



Talvez suas idéias revolucionárias o tenham feito se aproximar de Gustav Klimt, artista mais velho e experiente e bastante polêmico que era totalmente contra os dogmas moralistas da época e que certamente influenciou bastante sua obra. Por um tempo Klimt funcionou como uma espécie de mentor para Schiele, e o ajudava tanto comprando suas obras ou mesmo trocando pelas suas, além de financiar musas para o promissor pintor. Foi o responsável também por apresentar uma das modelos com quem depois Schiele vai viver uma tórrida relação, a musa Valerie Neuzil , ou simplesmente Wally.


“Morte e Donzela”, aliás, é o título de um dos seus quadros mais famosos e talvez mais belos , onde retrata a si mesmo e a Wally, pouco antes de abandoná-la em 1915 para servir na guerra e casar-se com Edith Harms.


Podemos dizer que o clímax do filme talvez esteja neste trecho em que pinta este famoso quadro que simboliza o próprio término e desfecho deste relacionamento e ao mesmo tempo mostra um lado egoísta, frio e contraditório de um artista preocupado em demasia consigo mesmo e com sua própria arte.


“A morte e a mulher”, 1915

Deixa em aberto o frágil envolvimento com a mulher que viria se casar, escolhida quase que aleatoriamente entre duas irmãs ricas, suas vizinhas na época.


Schiele esperando não ter que servir a pátria já que era um artista, é considerado apto e parte para os campos de guerra. Nesta época recebia visitas de sua atual esposa que não gostava de ser retratada daquela forma tão despudorada como ele sempre fez com suas musas anteriores. Em seu retorno participa de uma grande exposição em Viena que o projeta no cenário artístico, valorizando em muito suas obras. Porém não chega a usufruir deste sucesso , pois sua esposa Edith, grávida de seis meses contrai a gripe espanhola e vem a falecer e ele também morrerá em seguida desta mesma doença.


Por mais que de uma forma sutil o filme mostre a tormenta da perda do pai e até mesmo um ar por demais egocêntrico ao espelho, não aborda claramente o que isso representou e é tão marcante na obra deste pintor que foi a constante busca e entendimento da sexualidade e do sofrimento humano. Toda essa angústia que sentia e o atormentava o fazia retratar muito mais do que simplesmente corpos nus e um erotismo escrachado. Na verdade Schiele expressava em suas telas rostos amargurados, pessoas comuns , pobres, prostitutas e seus corpos distorcidos, meio disformes e até um tanto andróginos , tendo por muitas vezes também se auto retratado desta forma. Diferentemente do filme anterior produzido em 1981, “Egon Schiele – Excesso e Punição” do diretor Herbert Vesely que fez questão de mostrar um pintor constantemente aturdido em seus devaneios e alucinações, o novo longa apesar da belíssima fotografia de Carsten Thiele e a fiel representação de época, peca talvez por escolher ficar na superficialidade da narrativa histórica e não apresentar o lado mais enigmático da obra de Schiele.


Por Ula Pancetti.

  • 12 de jul. de 2018
  • 2 min de leitura

“Canastra Suja” com direção e roteiro de  Caio Sóh (“Teus Olhos Meus”e “Minutos Atrás”) está em cartaz e tem como ponto  forte a brilhante atuação do elenco que conta com Adriana  Esteves no papel de Maria, uma dona de casa que cuida de seus três filhos e seu marido alcóolatra Batista que trabalha como manobrista num apart-hotel , interpretado por Marco Ricca. A atriz Bianca Bin é a filha mais velha, e vive Emília que se divide entre o emprego num consultório de um dentista com quem mantém um flerte e cuidar de sua irmã mais nova, vivida por Cacá Ottoni no difícil papel da filha autista.  Já o novato Pedro Nercessian, cujo personagem é seu xará, interpreta o filho renegado pelo pai. Outra figura ligada a família e importante neste cenário é Tatu, o namorado de Emília e ao mesmo tempo, o amante de Maria, vivido pelo ator David Junior.

Maria cansada daquela vidinha um tanto sem graça, parece só se preocupar em manter-se em forma, fazendo o uso exagerado de remédios e exercícios ao ponto de  negligenciar a filha autista, deixando-a acorrentada enquanto transa com o amante, o que quase causa uma grande tragédia. Emília é uma fogosa e sedutora garota virgem em pleno século 21, que usa esse artifício como trunfo para ascender a uma vida melhor.

Seu irmão Pedro, em constantes brigas com o pai, a pretexto de sair de casa acaba se prostituindo, o que rendem engraçadas cenas a beira da piscina do rico cafetão, vivido pelo ator Milhen Cortaz.

Tatu é aquele cara que quer se dar bem e ganhar dinheiro fácil e rapidamente, o que o leva a fazer programas com homens. E pela insistência de Pedro acaba levando o cunhado para o mesmo caminho.

E Batista, o patriarca deste conturbado clã, reconhece que o alcoolismo o torna violento demais com aqueles que ama, vemos isso logo numa das primeiras cenas do filme,  em que participa de uma sessão do AA e busca coragem pra enfrentar o vício e o preconceito explícito. Mas não ficará imune às acusações de roubo por um dos moradores do Apart Hotel que acarreta na sua demissão e à expulsão de casa pelo possível estupro da própria filha.

Marco Ricca, talvez num dos melhores momentos de sua carreira  está maravilhoso  no papel deste pai , um  homem visivelmente sofrido e amargurado e Adriana Esteves simplesmente dá um banho de interpretação na cena em que desabafa com o filho que a acusa de maus tratos da irmã, num rompante grito desesperado de uma mulher em busca da sua própria felicidade.

Poderia parecer apenas um filme sobre o drama de uma família comum de classe média baixa, com suas dificuldades de convivência e de ter que lidar com as durezas da vida, mas como num jogo de cartas os personagens acabam sendo o grande destaque e assumem até um ar meio Rodrigueano, mostrando o lado sórdido, cruel, imoral e egoísta do ser humano, mas que apesar de tudo, conseguem driblar a ruína dessa estrutura familiar num mirabolante e inesperado desfecho.

  • 29 de jun. de 2018
  • 4 min de leitura

Tungstênio é o novo filme do diretor Heitor Dhalia que estreou dia 21 de Junho e foi baseado na história homônima do quadrinista Marcello Quintanilha, que teve sua HQ premiada em 2016 no Festival Internacional de história em quadrinhos de Angoulême na França, com o prêmio Fauve Polar-SNCF de melhor quadrinho no estilo romance policial.

O nome forte e estranho é o de um elemento químico extremamente duro, utilizado normalmente na confecção de luzes fluorescentes, armamentos e munição e que tem o maior ponto de fusão e ebulição entre os metais da tabela periódica. Como Heitor explicou em entrevista, Marcello a utiliza como uma metáfora que compara o metal duro a própria vida. E disse ainda: “É a forma como cada personagem lida com essa dureza, como você manuseia, atravessa ou contorna a dureza que a vida nos traz. E Tungstênio é esse ponto de explosão, o momento em que toda a banalidade do cotidiano e as tensões que estão submersas se deflagram.”

O longa que tem produção da Paranoid, coprodução da Globo Filmes e Canal Brasil e distribuição da Pagu Pictures,aborda temas difíceis como o abuso de gênero, o racismo latente, a pobreza e o uso da força em diversas relações violentas e reais de um Brasil contemporâneo.

A história se passa em Salvador e a trama se desenrola em função de dois pescadores que utilizam explosivos pra pescar e acabam entrelaçando o cotidiano de 4 elementos centrais. José Dumont , brilha como sempre e encarna o papel de Seu Ney, um sargento do exército aposentado, que continua a usar a rigidez dos tempos de outrora, o talentoso ator baiano Fabricio Boliveira vive o papel de Richard, policial violento e durão em conflito constante com sua esposa Keira que está prestes a largá-lo, cansada da violência do marido e é interpretada pela modelo e atriz estreante no cinema, Samira Carvalho, muito bem, aliás, nas suas catarses dramáticas, e o também novato e promissor ator baiano Wesley Guimarães, no papel de Caju, pequeno traficante que tem que lidar com a realidade nua e crua da periferia.



Cada um deles vai viver seus dramas pessoais e se depara com as ambiguidades e fragilidades do ser humano, o sargento durão também se revela doce com sua parceira nos bailes da terceira idade, o policial percebe que apesar de não conseguir deter seus instintos masculinos e violentos ama sua mulher, tem também uma esposa dividida entre obter o respeito do marido e resistir ao amor e desejo que sente por ele e o traficante que vive um drama de consciência quando sua sede de vingança esbarra com a possibilidade de ver sua mãe feliz.

Afinado com o quadrinista, o diretor tentou se manter ao máximo fiel à HQ original a ponto de Marcello elogiar o resultado final da difícil tarefa de transpor pras telas, toda a força de seu traço e disse ainda que isso se deve também ao excelente trabalho do elenco que agrega suas próprias experiências pessoais e dão vida aos personagens concebidos inicialmente pra um quadrinho, em uma linguagem totalmente viva e mutável de uma experiência cinematográfica.

Toda essa trama tem a voz de fundo do ator Milhen Cortaz que ao mesmo tempo que vai narrando e dramatizando as cenas, funciona como a própria consciência dos personagens, nossos anjos e demônios internos na eterna luta entre o bem e o mal.

O bacana do filme é que tanto Heitor que assina o projeto em parceria com Guel Arraes quanto Marcello que participa do roteiro juntamente com Marçal de Aquino e Fernando Bonassi, fizeram questão de retratar uma Salvador desconhecida da maioria de nós, os tradicionais cartões postais, cederam lugar a beleza do Forte de Nossa Senhora de Mont Serrat, da Praia da Boa Viagem, da Ponta do Humaitá e dos bairros da Ribeira e da Gamboa que mostram uma periferia esquecida e que normalmente fica à margem da sociedade soteropolitana.



Outro ponto forte do filme é a belíssima fotografia de Adolpho Veloso, que ao invés de usar o mesmo recurso do preto & branco da HQ, abusa da cor chapada, forte, com altos tons de contraste e um leve toque aveludado e azulado que torna tudo mais vívido e intenso. Interessante também o recurso do uso de alguns desenhos do quadrinista em momentos de tensão, onde se tem a reprodução desta mesma cena e o congelamento das imagens que nos remete direto ao universo de uma HQ e ao mesmo tempo evoca bem lá no fundo o cinema de Tarantino, tudo isso ao som constante de um berimbau que nos envolve num ritmo crescente e eletrizante.

Assim como o metal , o filme Tungstênio pode ser resumido num thriller denso, duro e resistente muito bem espelhado tanto nas imagens da pesca predatória com bombas até as luzes incandescentes de uma bela Salvador, mas que no fundo explode mesmo e chega ao seu clímax de ruptura ao fazer com que o expectador mergulhe nas emoções de cada personagem, vivenciando sua raiva, medo, dor e amor, sentimentos tão puros e inerentes a natureza humana.

Por Ula Pancetti

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